Lembranças de Joana
segunda-feira, 29 de setembro de 2008 | Comentários
O gramofone parou de tocar, o disco da Ângela Ro Ro, e eu... bem, eu continuava sentada, olhando para ele, com um copo de wisky sobre a mesinha ao lado do sofá.
Estava vazio, meu cigarro ja apagara, porém, continuava olhando para o gramofone.
Levantei, troquei o disco, coloquei Edith Piaf, peguei mais bebida, acendi um outro cigarro.
Me afundei na nostalgia quando começou tocar 'A quoi ça sert l'amour', porque nada mais nostálgico que Edith Piaf.
Quando a escuto, me sinto do lado de uma vitrola, em meados do século XIX, esperando notícias sobre a guerra. Notícias sobre algum primo que foi combater os nazistas, ou até mesmo, matar os judeus, como era de praxe naquela época.
E fico lembrando de toda a minha vida, de tudo que deu errado, as poucas coisas que deram certo. Lembro e fico me perguntando se eu tivesse agido de outra maneira, será que daria certo? Será que minhas frustrações terminariam?
Não, não tenho resposta para isso, nem nunca vou ter, porém, sei apenas de uma coisa: Deveria ter me arriscado mais, e não só com os relacionamentos. Talvez a coisa de que mais me arrependo seja o fato de ter me formado em medicina, apesar de ter um vida confortável. Preferia estar enlouquecida pensando que ja chegara o final do mês, e o dinheiro acabou, que as contas irão vencer e, não as paguei.
Mas, assim, teria uma ocupação pelo menos, já que, com 52 anos, estou aposentada, e fico aqui, nesse apartamento, o dia todo, sem nada para fazer.
Só lembrando das coisas que nao fiz, por medo de errar, por medo do que os outros iriam falar.
Quando tinha 45 anos, me apaixonei por um cara mais novo, sei que era recíproco, ele me disse. Não acreditei na hora, fiquei com medo; imagine eu, com um cara de 36 anos, quase dez anos mais novo. Não, isso era loucura, sou uma pessoa conhecida.. o que iriam falar?
É, nao arrisquei, poderia estar com ele hoje, feliz, rindo, viajando.
Mas, o orgulho é mais forte, sempre foi, e, não é de hoje.
Não quero contar detalhes da minha vidinha medíocre.
Aposto que muitos não lerão até aqui mesmo.
Vejo as pessoas, os casais passando na calçada, e fico imaginando, como são felizes, apesar de sempre estarem reclamando de dinheiro, das contas, de não sei o que. São felizes, e eu os invejo.
Eles, contudo, não sabem que o são, acham que a pior vida é aquela, que seu parceiro é um merda, que os outros são felizes.
Sempre é assim. E é o que eu estou dizendo, que os outros são felizes.
Talvez eu, tenha alcançado um pouco de felicidade depois dos 50 anos, descobri que posso escrever, como sempre quis.
Mesmo que sejam histórias frustradas assim, que muitos não lerão até o final.


Quem sou eu?

Enquanto achar necessário o uso das palavras borradas no papel, enquanto achar inevitável o fazer... enquanto tudo isso acontecer, sempre terei o que escrever, mesmo que para isso, eu não tenha nada em mente.
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